Um dia depois de ser exonerado do cargo de subsecretário do Sistema Penitenciário, João Carlos Lóssio mostrou indignação com o posicionamento da Polícia Civil do DF diante da fuga de 10 detentos da Penitenciária da Papuda no último domingo — enquanto esteve no cargo, o delegado não comentou a situação. Lóssio foi à Câmara Legislativa nesta quarta-feira (24) acompanhar os desdobramentos da crise que derrubou a cúpula do sistema carcerário.

Em uma conversa informal com os deputados Wellington Luiz (PMDB) e Raimundo Ribeiro (PSDB), Lóssio criticou a corporação e disse que não teve apoio para capturar os fugitivos. “Eu pedi apoio. Liguei pro delegado. Liguei para a Dipo. Os agentes estavam na Estrutural. Chegaram primeiro que a polícia. Ninguém veio me ajudar, cara. A nossa polícia acabou”. Também participou da conversa o delegado aposentado Cleber Monteiro, que já foi diretor-geral da Polícia Civil.

Lóssio também afirmou que o atual diretor-geral da Polícia Civil, Eric Seba, o boicotou durante o período em que esteve à frente da subsecretário do Sistema Penitenciário. “O Eric Seba é nosso amigo, mas pô, o cara me via como um possível substituto dele. Ele fica boicotando a gente para dar tudo errado. O quê é que isso, bicho?”

O encontro aconteceu logo após a sessão legislativa, marcada por discursos que criticaram a decisão do governador Rodrigo Rollemberg em trocar o comando do Sistema Penitenciário. Além de Lóssio, José Carlos Souto foi substituído na chefia da Secretaria de Justiça e Cidadania. O delegado Mauro Cezar Lima também perdeu o cargo de diretor do Presídio do Distrito Federal 1 (PDF 1) para Johnson Kennedy Monteiro. Os três haviam sido indicados aos cargos por Raimundo Ribeiro.

O único deputado que saiu em defesa de Rollemberg foi o seu correligionário Roosevelt Vilela (PSB). “Graças a Deus nunca pisei na Papuda. Mas era de responsabilidade dos agentes penitenciários quando serraram a cela, passaram pelo pátio e pularam o muro”. O discurso também não agradou o ex-subsecretário do Sistema Penitenciário. “Me chamou de Incompetente. Eu vou pagar um sapo pra ele. Incompetente é você que é bombeiro e nunca foi na Papuda”.

À reportagem, o deputado Welington Luiz afirmou que tem um bom relacionamento tanto com João Carlos Lóssio quanto com Eric Seba e que o que pode ter acontecido foi uma falta de comunicação entre eles. “Eu não posso dizer o que houve ou não houve porque eu não participei dessa operação. Eu estou afastado. Qualquer coisa que eu falar eu posso estar sendo leviano. Eu acho que faltou uma comunicação entre as instituições. São dois delegados muito sérios e muito preparados”, disse.

A reportagem tentou entrar em contato com João Carlos Lóssio, mas ele não atendeu as ligações.

Veja a transcrição da conversa:

L- Lóssio

W – Wellington Luiz

L – Nesse governo quem trabalha, amigo, não tem valor. Eu vou fazer o quê? Quem capturou os caras fui eu pessoalmente e quem trabalhou vai embora? Que porra é essa?

W – Raimundo, com esse aqui eu tô acostumado. Matavam um cana, a gente encontrava ele era no meio do mato, sujo… Essa barba chega ficava cinza. Esse é polícia…

Raimundo Ribeiro – Domingo é um dia que eu fico na minha casa por causa dos meus filhos que vão para lá. Oito e meia eu leio o troço. É automático. Peguei o telefone e liguei pro Lóssio. “Lóssio, como é que tá? Tô aqui na Papuda e já correndo atrás dos bandidos.” O governador não liga, secretário de Segurança não liga…O que você tem que fazer? Deu um problema dessa magnitude, instala um gabinete de crise, comete responsabilidade a cada um… Porra…

L – Welington, eu tava em frente a casa do Fillippeli Choveu um toró, Acabou a luz do Lago Sul inteiro. Eu pedi apoio. Liguei pro delegado (inaudível). Liguei para a Dipol. Os agentes estavam na Estrutural. Chegaram primeiro que a polícia. Ninguém veio me ajudar, cara. A nossa polícia acabou. Antigamente, a gente passava o rádio vinha todo mundo. Agora não vem ninguém. Te deixa na mão.

W – Era 10 minutos.

L – Eu tinha capturado os 10 se viesse a DOE, se viesse a 10ª DP, se viesse a 11ª, se viesse todo mundo, como era antigamente.

W – Antigamente, antes de você colocar o rádio, chovia de viatura. Chovia de viatura.

L – Hoje em dia nem fala mais no rádio. “Me ajuda. Tô aqui na casa do ex-governador.” Cadê? Ninguém ajuda. “Vou te mandar um cana.” “Um cana não adianta. Eu tô sozinho e tem três vagabundos na rua. Eu tô sozinho aqui.” Não veio ninguém, velho.

L – Não precisava porque é só em rebelião ou fuga em massa. Não houve fuga em massa. Houve fuga de 10 pessoas.

W – Porra! Dez presos perigosos. Quase um milhão de anos de cadeia.

L – Não precisava de dragão. Precisava era apoio. Da canoagem que não veio, mermão. Acabou canoagem.

W – Era de coração. Era o que a gente fazia antigamente.

L – Era de amor. Até hoje eu tenho. E sabe onde eu encontrei isso ainda da polícia antiga? No sistema penitenciário. A molecada lá, é igual a canoagem antiga. Veio 300 e foi comigo todo mundo, no meio do mato. De moto igual a um doido. Pergunta pra galera lá. Você conhece o pessoal. Igual à canoagem antiga. E nossa canoagem, cadê? Que porra é essa? Acabou. Eu tenho pena da sociedade. Eu tenho pena da sociedade. Eu tenho pena da sociedade.

W – Aquela nossa corrente já era. Esquece.

L – “Vou te mandar um pra te ajudar.” Aciona a CICvia. Aciona o caralho. Aciona todo mundo. Cadê a cavalaria? Não veio. O quê que isso, brother? Que polícia é essa, meu amigo? Tava me boicotando, que eu estava sendo boicotado desde o início, bicho. Tu lembra, Eu recebi até um ofício para eu (…) sob pena de cortar o meu… Aqui para nós, o Eric Seba é nosso amigo, mas pô, o cara me via como um possível substituto dele. Ele fica boicotando a gente para dar tudo errado. O quê que isso, bicho?

W – O problema é lá em cima.

L – Eu não acho, não. O tempo inteiro ele não me apoia. Maior dificuldade. Eu só consegui levar três caras da minha equipe, cara. Eu só consegui levar três policiais, amigo. Com 14 mil presos. Cleber, pelo amor de Deus. Outra coisa, fazer com que o sistema penitenciário, num ano, saia da secretaria, vai para outra, para outra, depois vai voltar…não vai aguentar. Vai explodir aquela porra. Deus ajude os servidores que estão lá dentro.

W – Rapaz, os caras não fazem ideia o barril de pólvora que é aquela porra lá. Nós sabemos..

L – Ainda me chamou de incompetente (falando Roosevelt Vilela).Eu vou pagar um sapo pra ele. Incompetente é você que é bombeiro e nunca foi na Papuda. Da Segurança pública.

W – Ele nunca entrou naquela porra. Eu falei: “mermão, entra naquela porra meia hora. Naquela rebelião que os presos queriam tomar a ala dos ex-policiais. Mermão, tu sabe como funciona aquela porra? Bicho, entra lá pra tu ver como é uma rebelião. Porra, o cara nunca entrou lá vai chamar a polícia de incompetente? Cara, na minha frente…

L – Eu vou dar uma peitada nele que ele vai ver como é que é.

W – Manda ele ficar lá meia hora.

L – Ele tinha obrigação de conhecer o sistema penitenciário. Você é da segurança pública. Você é um merda. Vou falar para ele. É um bosta.

Fonte: Correio Braziliense

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