Depois de mais um ano em que as notícias sobre a segurança pública no Brasil não foram nada animadoras, com aumento das taxas de homicídio e de outros crimes violentos no país, casos frequentes de violência e abuso de autoridade por parte das polícias, linchamentos e justiçamentos aplaudidos em redes sociais e o agravamento da superlotação carcerária, a virada do ano nos permite imaginar o que está por vir nesta área no ano de 2016.

No âmbito federal, a passagem de 2014 para 2015 foi marcada pela iniciativa do Ministério da Justiça em convocar um número considerável de especialistas de todo o país para formular uma política nacional de segurança. Depois de uma série de reuniões, chegou-se à conclusão de que o principal foco de atuação deveria ser a formulação e a implementação de um Pacto Nacional pela Redução dos Homicídios, com medidas que permitissem integrar as ações de União, Estados e municípios, ampliar a capacidade de apuração e processamento de mortes violentas intencionais e adotar políticas de prevenção capazes de retirar os jovens dos mercados ilegais e impedir o morticínio de pobres e negros nas periferias. Um ano depois, é possível constatar que não houve capacidade por parte do governo federal de, em meio à crise política, retomar um maior protagonismo na articulação de uma política nacional de segurança.

O Pacto ainda não saiu do papel e não se recuperou a capacidade de construir uma narrativa para a área que fosse capaz de atrair os governos estaduais para a sua construção, ou de colocar em pauta no debate público temas importantes como uma nova política de drogas ou a reforma das polícias. Talvez a única exceção tenha sido o Depen (Departamento Penitenciário Nacional), que no último período tem conseguido retomar uma agenda de ampliação das alternativas penais e de questionamento da política de superencarceramento e seu contraproducente impacto sobre as taxas de criminalidade.

No âmbito estadual, as perspectivas não são mais animadoras. Premidas pela crise fiscal e pelo descontentamento dos servidores da segurança pública diante das dificuldades para garantir o pagamento de salários e horas extras, e para recompor o efetivo das políticas e sua capacidade operacional (já bastante deteriorada), as autoridades da área têm procurado lidar com a crise, expressa no aumento das taxas da criminalidade violenta no Estado, com um discurso absolutamente defasado e que não tem mais conseguido seduzir a opinião pública. Declarações de que “a polícia está limitada em sua capacidade de atuação desde a Constituição de 88”, de que “a polícia prende, e a justiça solta”, ou de que “a criminalidade aumenta porque as mães estão fora trabalhando e deixam os filhos sem cuidado”, apenas demonstram o despreparo para lidar com o complexo cenário da conflitualidade social contemporânea em um contexto democrático, em que as instituições policiais (essenciais para a garantia do direito à segurança) devem atuar dentro da lei, com eficiência e submetidas a controle público. Talvez tenham sido justamente as políticas de prevenção à violência contra a mulher as que mais tenham sofrido com a nova orientação da secretaria de segurança, com resultados sensíveis nas taxas de violência ocorridas nos espaços domésticos/familiares, na sensação de segurança e na confiança da sociedade em relação às polícias.

No Congresso, o cenário é ainda mais desanimador. A gestão Eduardo Cunha na presidência da Câmara, na tentativa de desviar o foco das denúncias que pesam contra o atual presidente, procurou trazer à pauta temas que configuram aquilo que se conhece como “populismo punitivo”, ou seja, medidas que agradam ao cidadão comum, amedrontado com as altas taxas de criminalidade, mas que não contam com o respaldo das evidências científicas para comprovar a sua eficácia no combate ao crime e à violência. Muito ao contrário, propostas como a redução da maioridade penal, a revisão do estatuto do desarmamento e a flexibilização dos controles sobre a atividade policial produziriam efeito devastador sobre os poucos avanços conquistados no Brasil para a redução da violência desde a redemocratização.

Enfim, 2016 promete fortes emoções para quem espera uma sociedade com maior capacidade de administrar conflitos de forma pacífica. O cenário não é animador, o que não significa a impossibilidade de resistir e insistir na necessidade de medidas urgentes. Em meio a este quadro, não seria descabido propor que, além do ano da Olimpíada no Brasil, 2016 fosse marcado como o ano da virada na segurança pública, com a retomada de uma agenda de reforma das polícias que encaminhe a adoção do ciclo completo de policiamento e da carreira única; a reestruturação do ensino policial, com a adoção de um sistema nacional de cursos de graduação, mestrado e doutorado para os servidores da área; maior agilidade para o processamento e responsabilização criminal dos autores de crimes violentos intencionais; revisão da atual política de drogas, que superlota presídios e fortalece as facções criminais; e a adoção de políticas de prevenção efetivas, com participação dos municípios, focadas no recolhimento de armas, na atenção à juventude e aos grupos sociais vulneráveis. Iniciativas como o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que buscam trazer conhecimento e transparência para a gestão da segurança, são o melhor antídoto contra o improviso e o retrocesso.

Estas são as questões que estão em jogo no disputado cenário da segurança pública para 2016. Façam suas apostas!

Fonte: Fenapef

Filiação