Em 11 meses, foram registrados quase dez mil casos de estelionato. Idosos estão na mira de criminosos
Quando se trata de enganar, a criatividade dos golpistas parece não ter fim. Os crimes são os mais variados possíveis: vão desde mensagens no celular oferecendo prêmios até boletos falsos. Este último, principalmente, vem assustando os moradores do Distrito Federal. Apenas entre janeiro e novembro deste ano, a Secretaria de Segurança registrou 9.903 mil ocorrências de estelionato nas delegacias da região. O número resulta em cerca de 900 casos por mês, em média, ou 30 por dia.
Um dos casos mais recentes chama a atenção pela logística e riqueza de detalhes envolvidos. O golpe é feito por meio de uma fatura aparentemente normal de qualquer conta. Um dos casos foi registrado na 3ª Delegacia de Polícia (Cruzeiro), no mês passado. A vítima, Maria de Deus, de 49 anos, recebeu o boleto do plano de saúde em casa.
A carta estava fechada e com todos os dados da empresa, como de praxe. O valor também era o mesmo pago em todos os meses. Tinha, inclusive, código de barras. Mas, na hora de pagar, o valor foi para outra conta.
Maria só notou o golpe quando recebeu, um mês depois, a fatura com preço dobrado. No mesmo dia, ela procurou a empresa do plano de saúde. E foi surpreendida com a informação de que o boleto não havia sido pago. “Eu paguei normalmente quando chegou a fatura, mas, segundo a empresa, o dinheiro foi para outra conta. Ou seja, alguém ficou com mais de R$ 400. E é impressionante como a fatura é igual à original. Não tem diferença”, conta a dona de casa, que recorreu à Polícia Civil para tentar solucionar o caso e ser ressarcida.
Pequena diferença
Segundo a delegada da 3ª DP, Claudia Alcântara, que investiga o crime, na verdade, há um detalhe que diferencia o boleto falso do original: o número do código de barras. Se os três primeiros números, que revelam o código do banco, não se repetirem na primeira linha, o valor não está sendo enviado para a instituição correta. “É importante ressaltar isso porque muita gente não sabe. Eu também não sabia dessa regra. Mas ela existe e revela se o documento é verdadeiro”, salienta.
Artimanhas para extorquir dinheiro
Para a delegada Claudia Alcântara, no tipo de golpe como o do boleto, trata-se de uma rede em que, provavelmente, várias pessoas estão envolvidas. “O que precisamos saber, basicamente, é para onde o dinheiro foi”, aponta. A polícia investiga se o documento foi falsificado dentro da empresa, do banco ou, até mesmo, dos Correios, que enviam a correspondência. “É um trabalho minucioso”, diz.
De janeiro a novembro de 2014, a Polícia Civil registrou 9.959 crimes de estelionato – ou seja, a média se manteve. O delito inclui cartões e cheques clonados e falsos. Há ainda o velho golpe do bilhete premiado. “As principais vítimas desse crime são idosos. Eles são mais vulneráveis”, explica a delegada.
“Os golpistas são muito convincentes. São pessoas persuasivas. Envolvem a vítima. Quando a pessoa vê, já levaram o que queriam”, destacou a delegada. Segundo ela, ao abordar o idoso, os golpistas se certificam de que é uma pessoa com bens ou dinheiro no banco. “Eles abordam a pessoa no meio da rua, totalmente desprevenida. E convencem de que têm um bilhete premiado. Mas, para pegar o prêmio, precisam de alguém com conta em banco. Dizem que estão sem os documentos e coisas do tipo”.
Mulher perde R$ 45 mil
Em junho do ano passado, uma idosa perdeu aproximadamente R$ 45 mil com a promessa do bilhete premiado. A vítima também registrou o caso da 3ª DP. “Os moradores do Plano Piloto, Sudoeste e Cruzeiro são os mais visados. O crime está relacionado com a renda das pessoas e esses são lugares de pessoas de classes média e média alta”, explicou a delegada Claudia Alcântara.
“O golpe do bilhete premiado é sazonal. Quando vem à tona, eles param de aplicar. Os golpes, em geral, funcionam assim. Eles dão um tempo quando fica muito na mídia e voltam quando some. Então, por isso, é importante as pessoas estarem sempre atentas. É um crime comum e que muita gente cai. Esse da fatura, por exemplo, é muito bem feito. Qualquer pessoa pode ser enganada”, ressaltou.
Prejuízo
Até o fechamento desta reportagem, a vítima do golpe da fatura, Maria de Deus, ainda não havia sido ressarcida. Ela pagou a fatura seguinte, mas ainda devia a antiga, que foi fraudada pelos golpistas.
“Na verdade, o que chegou até mim foi uma correspondência falsa. Mas ninguém quer se responsabilizar. Eu, até hoje, não sei onde foi parar a verdadeira. Estou aguardando a investigação da polícia para saber o que faço. Até que me provem o contrário, continuo com o mesmo plano de saúde. Mas fui avisada de que, se não pagar o boleto em atraso em 60 dias, eles cancelam meu contrato”, afirmou a dona de casa.
Por e-mail, a assessoria de imprensa dos Correios argumentou que, “como a correspondência foi entregue fechada, não se responsabiliza pelo conteúdo, obedecendo o princípio constitucional da inviolabilidade de correspondências”. Neste caso, disse a empresa, “cabe apenas investigação policial, o que já está ocorrendo”.
Ligações premiadas
Nas ruas do Distrito Federal, não é uma tarefa difícil encontrar pessoas que tenham sofrido ao menos uma tentativa de golpe. Em um ponto de táxi com cinco taxistas, dois quase foram enganados com a promessa da ligação premiada.
“Minha esposa recebeu uma ligação falando que nós tínhamos ganhado um prêmio de R$ 20 mil. Só que, para receber o dinheiro, precisávamos primeiro fazer um depósito. Ela me ligou e na hora eu vi que era golpe. Mas, se ela não tivesse me telefonado, poderia cair”, contou Camilo Ramos, de 35 anos.
Convencimento
O colega dele, Geraldo Alves, de 62 anos, conta que recebeu uma ligação com a mesma promessa. Porém, o prêmio era ainda maior: R$ 50 mil. “Eles, primeiro, tentaram me convencer de que havia mesmo um prêmio, oferecido pela operadora, em um sorteio. E eu fui o ganhador. Só que começaram a falar para eu ir ao banco, aí desconfiei. Ainda assim, claro, a gente tem a esperança de que seja verdade. Imagina, R$ 50 mil de uma vez só. Aí, como eu estava perto do banco, fui mesmo. Chegando lá, olhei minha conta e falei para o rapaz, que ficou o tempo todo comigo no telefone, que não tinha dinheiro”, lembrou.
O taxista só foi perceber que se tratava de um golpe quando a pessoa do outro lado da linha pediu para ele colocar créditos em um outro telefone celular. “Quando eu avisei que não tinha dinheiro em conta, ele disse ‘ah, não tem problema. Coloca créditos no número X que o prêmio vai ser transferido para o senhor’”, relatou. “Nessa hora eu vi que era mesmo um golpe. Aí, desliguei”, disse Geraldo.
Pego com vários cartões
O caso mais recente de estelionato divulgado pela polícia do DF é de um homem preso em flagrante com vários cartões de crédito com diferentes nomes. O caso ocorreu no Conjunto A da QNM 12 de Ceilândia, por volta das 12h do último sábado.
Os policiais militares do 10º Batalhão da PM perceberam a atitude suspeita do homem em uma agência bancária e fizeram a abordagem.
Com o suspeito, os policiais encontraram três cartões do mesmo banco, mas de titularidades diferentes. No carro do homem havia mais 11 cartões bancários.
O suspeito foi levado à Superintendência da Policia Federal, uma vez que os documentos eram da Caixa Econômica.
Fonte: Jornal de Brasília