Assim como nas séries da TV, os investigadores do mundo real misturam dedicação, treinamento e equipamentos de alta tecnologia para solucionar casos difíceis. Profissionais brasilienses são referência para o país
Na última quinta-feira (15/10), após três meses de investigação, a Polícia Civil apresentou um suspeito de violentar pelo menos seis mulheres em três cidades do Distrito Federal. A prova científica produzida a partir do banco de DNA da corporação foi fundamental para confirmar que Flávio as havia estuprado. O episódio ocorreu quase 12 anos depois de um caso emblemático. Na tarde de 11 de novembro de 2003, o julgamento de um homem pela Justiça do Distrito Federal escreveu um novo capítulo na história da ciência forense brasileira.
Naquele dia, pela primeira vez no Brasil, uma pessoa foi condenada por um assassinato sem que o corpo da vítima tivesse sido encontrado. A sentença só foi possível graças a exames de DNA, que provaram que o sangue e os fios de cabelos encontrados no porta-malas do carro do suspeito pertenciam à vítima, uma jovem de apenas 15 anos. Onze anos se passaram, o assassino está solto graças a uma série de recursos protelatórios, mas Brasília continua sendo referência quando o assunto é perícia criminal.
Mesmo distante da ficção mostrada na telinha nas séries CSI (Investigação Criminal) — na qual os personagens recolhem provas, analisam, interrogam, prendem e solucionam os casos em menos de 40 minutos, após exames nem sempre reais —, os profissionais de Brasília na área de perícia e papiloscopia estão entre os melhores do Brasil. O reconhecimento é fruto de uma combinação que mistura dedicação, treinamento e equipamentos de alta tecnologia.
Além de sangue, fios de cabelo, fibras de tecidos, digitais, marcas de sapato e de pneus, as equipes de perícia trabalham com outras matérias-primas menos usuais, como pedaços de vidro, análises de temperatura, vento, peso, larvas, pedaços de insetos e urina. Fragmentos que, com a ajuda da ciência, tornam-se provas irrefutáveis e podem selar o destino de criminosos ou salvar da prisão pessoas acusadas injustamente. Cabe ao trabalho desses profissionais dar um norte na investigação policial.
“Os chefes”
O trabalho da equipe começa com uma chamada pelo rádio ou pelo telefone, sempre que houver necessidade. A ordem cronológica das solicitações determina o destino do grupo de perícia, formado por peritos criminais, papiloscopistas e agentes de polícia. Ao chegar à cena do crime, acidente ou incidente, a equipe é que manda. “Somos os chefes no local do crime”, explica Maurício Sercheli, perito criminal especializado em delitos de trânsito.
O tempo padrão de uma análise de campo dura de uma a cinco horas. Muitas vezes vai além, já que a investigação no local é metódica e exige cuidado. Primeiro, o grupo delimita um perímetro de observação e coleta de dados. Área isolada, fotografam o local para, depois, recolher as evidências.
A investigação parte do exame dos vestígios mais aparentes, como uma porta arrombada, uma mesa fora do lugar ou um corpo no chão. É neste momento que os profissionais definem, por exemplo, a movimentação dos envolvidos na cena do crime e a hora do ocorrido. Só depois, manchas de sangue e impressões digitais, entre outras evidências nem tão aparentes assim, são analisadas.
Para essas minúcias da investigação, o trabalho dos papiloscopistas se faz fundamental. São eles os responsáveis pela coleta, identificação e até o arquivamento das impressões digitais, conforme explica Rodrigo de Barros, presidente da Associação Brasiliense de Peritos Papiloscopistas (Asbrapp).
“Ao chegar à cena do crime, enquanto o foco dos peritos criminais é entender a dinâmica do crime, a nossa é buscar elementos que apontem a autoria.”
Cada um no seu lugar
Além das equipes externas, que vão ao local recolher as evidências, existem as internas, responsáveis pela análise do material recolhido. Essa divisão entre o trabalho externo e o interno tem um motivo. O objetivo é não deixar os profissionais se “contaminarem” pela comoção popular. Assim, cada caso recebe apenas uma sequência numérica. Nomes não são importantes quando a missão é apontar a autoria de um crime por meio de perícia.
“Nosso dever é materializar provas, independentemente de quem seja a vítima”, explica o perito criminal Rodrigo de Almeida, enquanto caminha por uma sala repleta de armas brancas — como facas, facões, foices e machados — depositadas em envelopes pardos, identificados apenas por números.
Na rua, trabalham as equipes nos casos de morte violenta, crimes contra o patrimônio, delitos de trânsito, engenharia e meio ambiente, incêndio e explosões. Tudo o que for recolhido e registrado será analisado em laboratórios. Muitas vezes, a cena do crime é recriada, o que tem ajudado a elucidar situações que parecem crimes perfeitos.
Essas análises laboratoriais envolvem desde o exame de balística, quando algum tiro foi disparado, a achados grafoscópicos (que confirmam a autenticidade de assinaturas e textos deixados em bilhetes, por exemplo). Existe até um setor — o de merceologia — que analisa equipamentos utilizados para a prática de jogos ilegais, e outro que se dedica exclusivamente aos crimes cibernéticos.
Impressões digitais
O trabalho dos papiloscopistas também é fundamental. Pode parecer coisa de televisão, mas é real: alguns desses profissionais conhecem os suspeitos só de olhar para a impressão digital deles. A análise é feita a olho nu. Os especialistas comparam as impressões e marcam, no mínimo, 13 pontos característicos para apontar a quem ela pertence. Isso porque é impossível duas pessoas terem os 13 pontos iguais.
Em outras situações, porém, um papiloscopista precisa analisar muitas vezes a mesma impressão digital para identificar um suspeito, principalmente quando elas são retiradas de cadáveres em estado avançado de putrefação.
Retratos falados e reconhecimento facial são outras ferramentas importantes utilizadas. Ajudam, principalmente, na localização de suspeitos e pessoas desaparecidas.
Fonte: Metrópoles