Do Metrópoles

A precariedade dos serviços públicos ofertados ao brasiliense poderia ser amenizada caso o governo local investisse o dinheiro disponível. Mas falhas na gestão agravam as mazelas que atingem a população. O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) analisou como está a execução do orçamento em seis áreas consideradas sensíveis, e o resultado é alarmante.

Segundo o MPDFT, mesmo com recursos liberados, o Governo do Distrito Federal (GDF) deixou de comprar medicamentos e equipamentos, além de não implementar melhorias no sistema público de saúde. Em relação aos outros cinco setores, o governo abriu mão de usar verba disponível para reforma de escolas, investimentos na área social, em mobilidade urbana e no sistema prisional.

A análise é do Núcleo Técnico de Assessoramento em Orçamento (NUO) do Ministério Público, com base nos gastos e investimentos previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA). Um exemplo que ilustra a gravidade da situação é o da saúde pública.

Até março de 2018, havia autorização para gastar R$ 680 milhões referentes a recursos do Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, R$ 361 milhões (53%) não se reverteram em benefícios à população e ficaram represados nos cofres oficiais.

Os números traduzem-se em uma dura realidade para quem precisa de atendimento em unidades como o Hospital Regional de Taguatinga (foto em destaque), onde faltam insumos e sobram pacientes.

Outros problemas

A educação também ficou com o pires na mão. Apesar das recorrentes reclamações de pais e alunos a respeito de escolas sucateadas, o GDF destinou, em média, R$ 10 mil para cada unidade na capital federal. Valores irrisórios, segundo o MPDFT.

“Esse dado revela o distanciamento do planejamento governamental da realidade, já que nenhuma unidade de ensino pode ser reformada com apenas R$ 10 mil”, destacou a procuradora Maria Rosynete de Oliveira Lima, da Procuradoria Distrital dos Direitos do Cidadão.

Nesse cenário, sobram exemplos do descaso governamental. Em fevereiro deste ano, parte do teto do Centro de Ensino Fundamental 102 Norte desabou. Alunos e professores levaram um susto. Por sorte, ninguém ficou ferido, mas quatro salas foram interditadas.

A baixa execução orçamentária, segundo o MPDFT, também afetou o sistema prisional. O Ministério Público ressaltou que a Secretaria da Segurança Pública e da Paz Social (SSP) tem, desde 2013, R$ 133 milhões disponíveis, por meio de convênio, para a reforma de quatro Centros de Detenção Provisória dentro do Complexo Penitenciário da Papuda. Ainda assim, cinco anos se passaram e nenhum centavo sequer foi aplicado.

Mobilidade urbana

Outra situação destacada no relatório e nas notas técnicas do MPDFT diz respeito à mobilidade urbana, que tem um orçamento executado por várias unidades, como a própria Secretaria de Mobilidade, o Transporte Urbano do Distrito Federal (DFTrans) e o Departamento de Estradas de Rodagem (DER-DF).

O caso do DER-DF chama atenção. Embora os brasilienses convivam diariamente com a péssima qualidade de pontes, passarelas e viadutos, foram reservados em 2018 apenas R$ 20 mil para a recuperação dessas estruturas e R$ 50 mil para a conservação desses equipamentos públicos. Mesmo com os valores irrisórios, nada chegou a ser executado, e a fatura veio muito mais cara para o contribuinte.

Em 6 de fevereiro, devido à falta de manutenção, o viaduto sobre a Galeria dos Estados, no Eixão Sul, desabou. Era quase meio-dia daquela terça-feira e, por um milagre, não houve fatalidades, uma vez que os blocos de concreto esmagaram carros e destruíram um restaurante sob o elevado.

Passados mais de seis meses desde o incidente no centro da capital da República, os escombros ainda integram a paisagem. Apenas na última quinta-feira (16/8) foi concluído o pregão eletrônico para escolher a empresa que fará a reconstrução do viaduto.

A vencedora é a Via Engenharia, cujo dono, Fernando Márcio Queiroz, está entre os 12 réus da Operação Panatenaico, que apura desvio de recursos públicos e corrupção na reforma do Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha.

Por força de decisão judicial, a Via Engenharia estava proibida de fechar contratos com o GDF, mas conseguiu reverter a sanção. Agora, propôs-se a construir o viaduto no centro de Brasília por R$ 10,9 milhões – dinheiro que sairá do bolso dos brasilienses.

Assistência desassistida

Com relação às políticas para o idoso, o MPDFT observou que, embora a Lei Orçamentária de 2018 preveja sete programas de trabalho relacionados a essa população, a execução de recursos era nula até maio deste ano.

O Fundo de Direitos do Idoso fechou 2017 sem nenhuma aplicação dos valores disponíveis. No entanto, o MPDFT frisa o contraponto com as áreas de publicidade e propaganda, que tiveram dotação autorizada de quase R$ 1,5 milhão.

Todos esses exemplos demonstram que nem sempre as falhas do Estado na prestação de serviços estão relacionadas à falta de recursos. Em muitos casos, os problemas são a ineficiência na aplicação do dinheiro.

Nesse contexto, o trabalho realizado pelo Núcleo Técnico de Assessoramento em Orçamento do MPDFT visa dar transparência ao uso dos recursos públicos na prestação de serviços essenciais à sociedade. O órgão iniciou esse monitoramento em 2016.

As análises, segundo o MPDFT, ajudam a nortear o trabalho nas promotorias de Justiça e a indicar as principais demandas da sociedade. Os dados levantados por esse núcleo são encaminhados para as áreas responsáveis, para providências.

O que diz o GDF

Procurado pela reportagem para comentar a análise do MPDFT, o GDF disse que “o Governo do Distrito Federal analisará o relatório quando recebê-lo oficialmente”.

 

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