Do Metrópoles
Abandonada, suja, malcuidada, fedida e deplorável. Esses são alguns adjetivos usados por passageiros para descrever a Rodoviária do Plano Piloto. Basta uma volta pelo local para confirmar o descaso com o terminal. Cerca de 700 mil pessoas circulam na plataforma diariamente. Onde a visão alcança, há problemas. No entanto, se depender do ritmo e da boa vontade do Governo do Distrito Federal (GDF), as melhorias ainda vão demorar a acontecer.
A licitação para a reforma foi feita no fim da gestão de Agnelo Queiroz (PT) e previu investimentos da ordem de R$ 30,3 milhões. A seis meses do encerramento do seu mandato, o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) utilizou somente R$ 11 milhões do recurso. Apesar de o GDF garantir que 45% das obras foram concluídas, a Rodoviária permanece em estado degradante.
Os transtornos são vivenciados por quem passa pelo local. Diabética, hipertensa e com dificuldades de locomoção, a pensionista Maria de Fátima Sousa, 64 anos, enfrenta um calvário quase diário quando tenta acessar a plataforma superior. Segundo ela, as escadas rolantes e os elevadores recorrentemente estão com defeito, o que a obriga a subir por escadas normais. “Chego cansada, esbaforida. É uma falta de respeito imensa com a gente”, protesta.
Com manutenção precária, andar na Rodoviária exige dos passageiros atenção redobrada. No piso superior, um buraco de cerca de 15 centímetros na entrada da faixa de pedestres costuma fazer vítimas com frequência. Para piorar, oito lâmpadas estão danificadas, contribuindo para a falta de visibilidade dos frequentadores.
O serralheiro Jaílson Mendes, 43, quase torceu o pé na cratera e reclama da falta de zelo. “Quantas pessoas não se machucam neste buraco? E ainda é escuro, não dá para ver. É revoltante o descaso do governo com um lugar que fica no meio da Esplanada”, reclama.
Deboche
Não são apenas os passageiros que sofrem com a ausência do Estado no maior terminal rodoviário da capital do país. Comerciantes reclamam da concorrência desleal de ambulantes e da completa ineficiência da Agência de Fiscalização (Agefis) para repreendê-los. No início da noite dessa terça-feira (19/6), a reportagem do Metrópoles flagrou o deboche dos vendedores clandestinos com os servidores da autarquia.
Três deles passavam na presença de policiais militares. Sem correria, os ambulantes recolheram os produtos, se afastaram por alguns metros e em menos de 20 segundos voltaram a expor toda a mercadoria no chão do terminal.
A Agefis informou que todos os dias há uma equipe permanente na área central de Brasília, incluindo a Rodoviária. O órgão garantiu ter feito 118 autos de apreensão no local somente em 2018, o que teria resultado em 9.975 produtos recolhidos.
Drogas e insegurança
Quem tem o costume de passar pela Rodoviária já sabe que qualquer desatenção com bolsas, carteiras, joias e relógios pode ser fatal. A falta de segurança faz com que pessoas andem desconfiadas ao extremo, como relata Arielson de Holanda, 24. “Fui pedir uma informação para uma mulher e ela se agarrou na bolsa e correu. Imaginou que eu iria assaltá-la.”
Além dos furtos, o tráfico e o consumo de drogas a qualquer hora do dia assustam os passageiros. Com tímida repressão policial e programas de tratamento ineficientes, dependentes de crack acendem pedras na frente de mulheres, crianças e idosos. “Não me sinto segura. O que mais me incomoda é o uso de drogas”, admite a gerente comercial Glaucione Santana, 41 anos.
Maria Romão, 49, é vendedora no local há pelo menos oito anos. Para ela, o trabalho infantil é o que mais chama atenção. “Dói muito ver crianças sendo usadas pelos pais para pedir esmola”, lamenta.
Banheiros
Os banheiros do terminal também apresentam aspecto de abandono. Além de um odor quase insuportável, funcionários da limpeza colocam vasilhames para aparar a urina de mictórios com defeitos. Para piorar, há sanitários interditados por falta de reparos.
O cadeirante José Alberto Lemos, 61 anos, integra o time de insatisfeitos com a degradação dos banheiros. “Não funcionam. Alguns estão quebrados e até sem portas”. Para ele, há outras dificuldades ainda maiores, como a acessibilidade precária no terminal.
Já aconteceu de eu desistir de subir para o piso superior por falta de escadas rolantes e elevadores. A verdade é que Brasília está jogada. Ontem, para ir embora, tive que esperar dois ônibus, pois a rampa do elevador não funcionava” José Alberto Lemos, cadeirante
GDF culpa vândalos
Sobre o estado precário da Rodoviária do Plano Piloto, a Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap) destacou que o contrato de manutenção das escadas rolantes está vigente e os problemas apontados pela reportagem são culpa do vandalismo.
“A empresa responsável pela manutenção sempre verifica que os elevadores e as escadas rolantes não ficam mais de dois dias, em média, sem a necessidade de reparos quando estão em uso de forma ininterrupta. Mesmo com a contratação de uma empresa para a manutenção preventiva e corretiva, a depredação constante dificulta a vida das pessoas e a regularidade dos serviços”, destacou a Novacap, em nota.
A empresa ainda atribuiu a vândalos o buraco na entrada da faixa de pedestres e garantiu que isolará o local até o conserto ser feito. “Devido ao vandalismo, desde 2014 foram gastos mais de R$ 229 mil só em reparos, em razão da depredação de escadas rolantes, degraus amassados, corrimão quebrado, dispositivo de acionamento danificado e elevadores com portas empenadas”.
Por fim, esclareceu que as obras no terminal só serão finalizadas em abril de 2019.
Confira imagens e vídeos da matéria no site do Metrópoles.