Imagine a cena: alguém vai resolver algo fora de casa e nunca mais aparece… Muitas das pessoas tidas como desaparecidas, estão, na verdade, mortas. E como o indivíduo conseguiria lutar pelo seu último ato de dignidade (o de ser devidamente identificado) se não está mais entre nós? Além do que, se tiver sido morto, como ter o crime investigado e conseguir que a Justiça siga seu curso se a suspeita é de desaparecimento?
Em 2013, depois da chegada do Sistema de Identificação Digital Automatizado (AFIS) na Policia Civil do Distrito Federal (PCDF), foi realizada, pelo Instituto de Identificação (II-DF), uma operação chamada “Anjo da Guarda”, que conseguiu identificar 44 pessoas enterradas como indigentes entre os anos de 1996 a 2010.
Muitos não sabem que, geralmente, há na Polícia Civil brasileira um quadro técnico especializado para lidar com tais questões. São os chamados Peritos, que na área da Identificação Humana são profissionais com conhecimentos científicos específicos e, a partir de seu exame, serão capazes de dizer não apenas a causa da morte, mas afirmar, em laudo pericial, a correta e precisa identificação dos finados.
Cada especialidade exige um alto grau de conhecimento, sendo necessária constante atualização profissional e até envolvimento com pesquisas acadêmicas. Há diferentes formações e, consequentemente, os peritos que se dedicam à identificação pelo exame dos ossos são diferentes dos que examinam a pele humana, as arcadas dentárias, o DNA, entre outros.
Os peritos papiloscopistas atuam numa das áreas mais árduas da perícia brasileira, conhecida cientificamente como Necropapiloscopia. Eles utilizam roupas especiais, máscaras e reagentes químicos no cotidiano para o tratamento dos tecidos cadavéricos com o objetivo de recuperar características únicas presentes na superfície e no interior da pele.
Apenas esses profissionais são especialistas em particularidades da pele humana. Compreendem os mecanismos responsáveis pela formação das cristas e sulcos presentes nela e, o mais importante, são experts em como utilizar tais características para identificar os falecidos de maneira inequívoca.
É um trabalho minucioso e que exige paciência, determinação e perseverança por parte desses profissionais. O resultado desse trabalho traz a segurança jurídica para a declaração de óbito, a garantia de direitos de herança às famílias dos entes falecidos e marca também o início de investigações sobre as circunstâncias de uma determinada morte, nos casos em que sejam desconhecidas.
Eles também atuam em casos de desastres, tais como queda de aviões, inundações e terremotos. No final do mês de setembro de 2006 ocorreu o mais mortífero acidente da aviação brasileira. Uma colisão aérea derrubou o Boeing 737 que ia de Manaus a Brasília produzindo 154 vítimas, das quais 85% foram identificadas pela perícia papiloscópica, mesmo com todas as dificuldades e desafios apresentados pelas condições do local dos destroços, no interior do estado do Mato Grosso.
A tecnologia biométrica é importante. A operação de um sistema biométrico aliada à expertise técnico-científica permite que várias identificações cadavéricas sejam realizadas cotidianamente, mesmo sem a apresentação de suspeitos.
Acabamos de passar pelo dia de finados. A sociedade ganha com a presença desses profissionais que identificam os falecidos. E por serem tão humanos, são capazes de devolver a dignidade àqueles que já não podem mais defende-la, assim como para seus familiares.
Publicado originalmente no Jornal do Tocantins
Rodrigo Meneses
Diretor de Informática adjunto do Sinpol-DF
Presidente da Associação Brasiliense dos Peritos Papiloscopistas (Asbrapp)