Uma das contabilidades mais macabras da atualidade brasileira no início de 2015 é a da contagem dos mortos pelo crime e violência. Segundo diferentes fontes, em 2013 (último ano com estatísticas já consolidadas…) mais de 54 mil brasileiros foram assassinados, contando entre eles 490 policiais (quase cinco centenas…). Diferentes números podem ser referidos/desagregados dessa cifra total deplorável, para serem estudados no contexto da letalidade homicida contra “subtotais”/grupos específicos. Diversos focos da vitimização letal podem e são enfatizados na mídia e na literatura acadêmica – como o dos homens jovens, excluídos, “não-brancos”, etc. Estranhamente, não parece existir um foco na vitimização de policiais…
Em uma sociedade democrática e pluralística como a brasileira, diferentes ideologias eventualmente sustentam teses bastante divergentes, partindo da mesma base factual – caso das mortes anuais de 2013 por homicídios. É o que acontece vis-à-vis associar os números gerais brasileiros de homicídios e os números específicos de policiais mortos no país, ou seja, o dos “assassinados em geral” e o dos “policiais abatidos”? – Ainda assim, não parece caber ao Estado algo que não seja tratar todos e cada um dos casos de homicídios, não como uma estatística irreversível, mas como algo intolerável e que precisa e deve ser mudado. Ainda assim, e estranhamente, há quem justifique a apuração rigorosa e contenção dos “números gerais” e de certos sub-grupos, dando entretanto, as mortes de policiais, como “fait accompli” (do francês, algo que foi feito ou acontecido e não pode ser mudado), sem maior atenção ou zelo…
Um argumento acusatório da “violência policial” vem sendo afirmado, repetido e reverberado veementemente por uma corrente político-ideológica, e que soa especificamente como algo contra todas as instituições policiais do país, sem poupar nada delas e nenhum dos seus membros respectivos. – Será mesmo possível que os policiais brasileiros sejam, todos eles, recrutados em algum “império do mal”? – Por tudo isso, também soa, contraintuitivo que, mesmo os policiais, lídimos representantes do Estado e do monopólio legítimo da força em prol da lei e da ordem, sejam eles mesmos “vítimas preferenciais” da letalidade homicida que se abateu sobre vários milhares da cidadania em geral e ameaça todos eles. E é sempre oportuno afirmar e seguir repetindo que nenhuma vida tenha mais ou menos valor que outra, todas elas sendo preciosas…
O “silencio institucional” acerca das mortes de policiais é algo intrigante, afinal, em nível local e federal são quase sessenta polícias… O Estado Brasileiro, ao qual todos os policiais do país servem e representam, independente da natureza da instituição de pertencimento, não parece mobilizado em explicar a razão de tantas mortes de policiais (o índice respectivo é superior aos da maioria dos outros países…), nem anunciar medidas especificas para fazer com que essas mortes ao menos diminuam.
Se as quase 500 mortes de policiais brasileiros por homicídios em 2013 correspondem a um índice de 0,25 mortes por 100 mil habitantes (de uma população geral de aproximadamente 200 milhões), nos EUA as 32 mortes de policiais por homicídios em 2013 equivalem a um índice de 0,01 mortes por 100 mil habitantes (de uma população geral de aproximadamente 315 milhões). Ou seja, proporcionalmente, morrem 25 vezes mais policiais brasileiros por homicídios do que seus homólogos norte-americanos.
– Mas o que acontece ao comparar o índice geral de homicídios do Brasil e dos EUA?
Se as mais de 54.800 mortes de brasileiros por homicídios em 2013 correspondem a um índice de 27,4 mortes por 100 mil habitantes, nos EUA as 14.196 mortes por homicídios em 2013 correspondem a um índice de 4,5 mortes por 100 mil habitantes .
Não sem razão, a rotatividade dos quadros de algumas polícias brasileiras passou a ser notável, não mais apenas por questões salariais, mas já agora pelo risco considerável de “morrer ganhando a vida” enquanto profissional da segurança de todos.
Ao que tudo indica, o alto índice de homicídios de policiais do país seguirá como alguma espécie de “tabu” para o Estado Brasileiro , tal qual já ocorre diante de outras importantes questões como a retumbante falência do sistema prisional. – Até quando e a que preço para a população em geral?
GEORGE FELIPE DE LIMA DANTAS: Doutor pela “The George Washington University” (GWU) Washington, D.C, EUA. Ex-Agente da Segurança Pública (Tenente-Coronel Reformado da Polícia Militar do Distrito Federal – PMDF). Ex-Coordenador de pós-graduação em Gestão da Segurança Pública do Núcleo de Estudos em Segurança Pública (NUSP) da UPIS – Faculdades Integradas e ex-Coordenador para Assuntos de Segurança Pública do Núcleo de Estudos em Defesa, Segurança e Ordem Pública (NEDOP) do Centro Universitário UNIDF. Blog: http://blogandoseguranca.blogspot.com/