Do Metrópoles

A Polícia Civil do Distrito Federal lançou nesta quarta-feira (23/10/2019) edital para a compra de 5 mil armas de fogo. O pregão eletrônico vai optar pela empresa que fornecer os equipamentos com o menor preço. No documento, a PCDF especifica o tipo de material a ser adquirido: pistola semiautomática 9 milímetros, carregador de uso individual, coldres velado e operacional, munição, maleta de transporte e manual de instrução.

Os interessados poderão formalizar as propostas exclusivamente por meio do site www.comprasgovernamentais.gov.br, até 10h30 do dia 3 de dezembro de 2019. Segundo o diretor-geral da corporação, Robson Cândido, a escolha pelo modelo 9 milímetros atende a um anseio dos integrantes do órgão de sistema de segurança. “Fizemos uma enquete e o resultado foi praticamente unânime pela 9 milímetros, que é de mais fácil pronto emprego e tem a munição 18% mais barata”, pontua o delegado, ao explicar a comparação com as atuais pistolas .40.

De acordo com Cândido, o pregão deve ser concluído no início de 2020 e a previsão é de que as novas armas comecem a ser entregues entre abril e maio.

Armas recolhidas na PCDF

Em maio de 2018, o Ministério Público do DF e Territórios ajuizou ações civil pública e criminal contra a empresa Forjas Taurus S/A, que forneceu armas de fogo para a Polícia Civil brasiliense. O material comprado, segundo denúncias, apresentava risco de disparos acidentais no caso de queda ao chão. Por conta dos problemas, o MPDFT pediu pagamento de indenização de R$ 11.656.223,90 por dano moral e recomendou à corporação que recolhesse as armas adquiridas pela PCDF em 2014.

Além disso, o MP cobrou a responsabilização criminal de seis executivos da empresa. Eles foram denunciados por crimes contra as relações de consumo, previstos na Lei nº 8.137/90, como comercializar produtos em condições impróprias e induzir o consumidor a erro.

A ação, que está em fase de alegações finais, partiu do Núcleo de Investigação e Controle Externo da Atividade Policial (NCAP) em conjunto com a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e Social (Prodep).

O MPDFT teve acesso a vários relatos de panes durante uso, inclusive a respeito de situações que ocasionaram lesões nos policiais. O contrato firmado entre a Taurus e a PCDF estabelecia que as armas deveriam ter mecanismo contra disparos acidentais, mas foi constatado que esse dispositivo não existia ou não funcionava adequadamente.

Os casos de disparos acidentais são recorrentes em delegacias e batalhões. Técnicos penitenciários, agentes de polícia e militares colecionam histórias e cicatrizes decorrentes do mau funcionamento dos equipamentos da marca brasileira.

Teste decisivo

Diante das ocorrências registradas, o Instituto de Criminalística da Polícia Civil fez um teste por amostragem em 25 pistolas .40. Dez apresentaram falhas de segurança e dispararam ao cair no chão. O laudo, concluído em 2016, foi revelado com exclusividade pelo Metrópoles.

As armas usadas nos testes pertenciam à Polícia Civil e não apresentavam nenhum defeito aparente. Durante as verificações, elas foram jogadas em piso de concreto e borracha em cinco posições diferentes. Em três casos, o projétil foi detonado e, em sete, houve disparo, mas sem alteração na munição. A revisão do armamento foi tratada como urgente e partiu da Divisão de Controle de Armas e Explosivos (Dame).

De acordo com o documento, foi constatado que o ponto central para o tiro acidental é uma falha na trava de segurança. Quando há avaria, o projétil pode ser detonado sem o acionamento do gatilho.

Essa arma não oferece segurança para o policial e muito menos para a população. Ela pode disparar sozinha ou, em alguns casos, nem mesmo atirar em uma situação de perigo. As corporações não têm culpa. Isso acontece porque tem muita politicagem envolvida e não podemos comprar armas de outras marcas. A Taurus sempre financiou campanhas políticas, entre outros fatores. Policial militar que pediu para não ter nome divulgado.

Histórico

Em 2005, um agente de polícia deixou a arma cair em casa. A pistola disparou e atingiu a orelha direita dele. Em depoimento, alertou que o tio estava ao seu lado no momento do incidente e que algo pior poderia ter ocorrido.

Outro incidente registrado em 2008 mostrou o quão vulnerável é o equipamento. Um agente da Divisão de Operações Especiais (DOE) estava em frente a um restaurante, na 707 Norte, quando a arma caiu e disparou ao ter contato com o chão. Por sorte, o projétil foi em direção ao céu e não atingiu ninguém.

O agente Luciano Vieira não teve a mesma sorte. Após sua pistola .40 disparar, ele foi atingido na região da barriga e a bala se alojou no ombro. Segundo o servidor público, há evidências concretas de que a pane é recorrente. “É muito importante o policial registrar ocorrência se houver qualquer problema. A ocorrência também é mais uma prova que teremos sobre as constantes falhas”, frisa.

Em abril de 2015, um agente penitenciário foi alvejado na panturrilha enquanto se preparava, colocando o cinto tático, para um curso de intervenção. “Em momento algum houve contato manual com a arma. Foi prestado os primeiros socorros. O agente foi encaminhado ao Hospital de Base em estado grave”, consta na ocorrência.

No mesmo ano, a pistola passou por perícia, que constatou falha no dispositivo de segurança. A arma disparou nos dois testes de queda. Os exames apontaram que a trava interna de segurança estava mal conservada. Em junho de 2015, o Instituto de Criminalística também verificou falha na pistola usada por outra agente de polícia. Ao cair, o projétil foi detonado e atingiu o teto do alojamento feminino de uma delegacia do Guará.

Boletim

Na época da divulgação do laudo, a Polícia Civil afirmou que tinha conhecimento dos casos, pois quando ocorre defeito o policial deve registrar boletim de ocorrência. A corporação informou que havia cinco registros dessa natureza envolvendo agentes da PCDF.

O Exército Brasileiro, que controla a venda de armas no país, também foi oficiado, à época, para que prestasse esclarecimento ao MPDFT sobre as providências tomadas em relação às notícias de graves falhas nas pistolas. Ainda em 2016, o órgão proibiu a produção e a comercialização das pistolas modelo 24/7 .40 S&W, fabricadas pela Forjas Taurus.

PMDF também recolhe pistolas

A Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) também determinou, em 29 de julho deste ano, o recolhimento imediato de 12.438 pistolas da marca Forjas Taurus. De acordo com relatórios técnicos, as armas apresentam graves falhas e são inadequadas para uso.

Na ocasião, em nota, a Taurus declarou não existir “penalidade de declaração de inidoneidade aplicada contra a empresa”. “Publicações incorretas ou falsas ensejarão a tomada das medidas legais cabíveis. A Taurus cumpriu todos os contratos de aquisição de armamentos celebrados com a PMDF, entre os anos 2006 e 2011, e com a PCDF em 2014”.

A Taurus destacou, ainda, que todas as perícias técnicas realizadas de acordo com as normas vigentes comprovaram não haver falha ou defeito nos mecanismos de funcionamento e segurança das armas da companhia.

 

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