Do G1/BRASÍLIA
A Polícia Civil do Distrito Federal vai intimar nesta sexta-feira (10) 30 donos ou gerentes de hotéis e restaurantes, suspeitos de venderem carne clandestina aos clientes. O objetivo é saber se eles tinham conhecimento da prática e descobrir quem eram os responsáveis pela compra dos alimentos. Os empresários devem ser ouvidos na próxima semana.
As investigações começaram depois que a polícia apreendeu 1,4 tonelada de carne irregular em Águas Claras no banco de duas picapes e em casas de Taguatinga, no dia 2. As apurações estão a cargo da Coordenação de Repressão a Crimes contra o Consumidor, Ordem Tributária e a Fraudes (Corf).
Segundo a corporação, os alimentos eram trazidos por duas pessoas de Goiás e revendidos em restaurantes e hotéis renomados de Brasília. Os dois distribuidores e o comprador foram presos por comércio clandestino e levados para depor na sede da polícia. Eles foram liberados após audiência de custódia.
O delegado Ataliba Neto contou ao G1 que uma agenda encontrada na casa do comprador lista 25 pessoas. Para cada nome, há um hotel ou restaurante relacionado na página. “A gente suspeita que seja uma lista de contatos que são clientes dele”, disse. Os outros cinco nomes estavam em uma lista de posse de um dos motoristas das duas picapes flagradas transportando a carne.
Segundo o delegado, a maioria dos nomes listados são referentes a restaurantes de regiões afastadas do centro de Brasília, como Ceilândia. Também há restaurantes “de prestígio” no Plano Piloto. Os nomes só devem ser revelados ao fim da investigação.
“São restaurantes e hotéis renomados. A maioria deles ficam na área nobre do Plano Piloto mesmo. Eles ficam no Setor Hoteleiro, na Asa Sul e na Asa Norte. Tem até hotel com quatro estrelas no meio”, declarou o delegado. “A nossa previsão é de encerrar o inquérito em um mês”, disse.
Presidente do Sindhobar – entidade que representa bares, hotéis e restaurantes –, Joel da Silva disse ao G1 que nunca recebeu denúncia do tipo. Caso comprovadas as suspeitas da polícia, ele afirma que pode haver punição. “Isso é questão de segurança alimentar. Se for nosso associado, vamos levar o caso para a diretoria e vamos julgar o comportamento e a moral e ética da empresa. Mas duvido que seja nosso associado.”
Carne imprópria
De acordo com Ataliba Neto, os 1,2 mil kg de carne apreendidos na última quinta estavam sem documentação e sem selo de inspeção. O item é um tipo de “atestado” que mostra de onde vem o animal, onde foi abatido, a data de fabricação e a temperatura em que a carne deve ser mantida, por exemplo.
Da carga total apreendida, 400 kg estavam em uma picape, sendo transportados sem refrigeração. Na casa do comprador, a polícia encontrou mais cerca de 800 kg de carne armazenada – parte dela também irregular. A investigação começou há dois meses, após denúncia anônima.
“Ele guardava na própria residência. Ele tem uma empresa registrada no mesmo endereço residencial e revendia para restaurantes e hotéis. Alguns até renomados”, disse o delegado.
O comércio de carne e outros produtos de origem animal, como peixes e queijos, é regulado pela Secretaria de Agricultura. Caso o vendedor não consiga comprovar a origem do alimento, pode levar multa de até R$ 122 mil. O produto também pode ser doado ao zoológico e ONGs de proteção aos animais. “A carne é imprópria para consumo humano, uma vez que não sabemos a procedência dela”, afirmou o diretor de Fiscalização da Secretaria de Agricultura, Fábio Junior Oliveira.
Apreensões
A Secretaria de Agricultura apreendeu cerca de 10 toneladas de carne irregular em cinco operações desde o começo deste ano. Segundo o diretor de Fiscalização, esse tipo de produto é comprado principalmente por feiras, que revendem para consumidores que não fazem ideia de que aquele alimento é clandestino.
“É uma questão de valor. Sai até 50% mais barato do que uma carne regular porque não tem imposto, não tem questão de ter que sustentar um abatedouro ou pagar pessoas pelo abate”, disse Fábio Júnior Oliveira. Para ele, checar o rótulo que mostra a procedência da carne e a data de validade deve ser tornar um hábito do consumidor.
Quando um estabelecimento é flagrado vendendo carne irregular, a Vigilância Sanitária é chamada para autuar o comércio. “O estabelecimento que comercializa carne que não sabe a procedência, que pode ser vetor de contaminação, estásendo irresponsável. É questão de saúde pública. E o local pode responder criminalmente”, afirmou o diretor.
Doenças
É possível contrair doenças ingerindo alimento de procedência e tratamento duvidosos. A lista de enfermidades inclui a brucelose, causada por uma bactéria alojada em carnes ou leite. Ela provoca dores nas costas, na cabeça e no abdômen, fadiga e suor intenso.
Uma das doenças mais perigosas é a neurocisticercose, adquirida quando são ingeridos alimentos contaminados por ovos de tênia (conhecida popularmente como solitária). Ela pode causar epilepsia crônica. Nos casos mais graves, pode provocar infarto cerebral.