Da UOL – Blog do Sakamoto

O governo Michel Temer vai acelerar a liberação de emendas parlamentares para deputados federais que se comprometerem a votar a favor da Reforma da Previdência. Esses recursos são usados em propostas apresentadas pelos parlamentares a fim de beneficiar suas bases eleitorais.

A solicitação de emendas para atender demandas justas da população faz parte da democracia. O problema é quando o processo de sua liberação inclui tomaladacás.

A tática não é nova, pelo contrário, foi sistematicamente utilizada por todos os governos até aqui. O interessante desta vez é que ela tem o objetivo claro de compensar o prejuízo eleitoral que os deputados terão ao votar a favor da reforma. Ou seja, torcer para que o povo fique tão feliz com um esperado asfaltamento de rodovia vicinal que se esqueça que vai se aposentar mais para frente. Isso é outro reconhecimento de que a proposta está sendo tocada à revelia da maior parte da população.

De acordo com a última pesquisa Datafolha, divulgada no Dia do Trabalhador (01/05), 71% da população brasileira é contra a Reforma da Previdência. Pesquisa Vox Populi havia apontado que 93% rejeita o aumento da idade de aposentadoria para 65 anos e do tempo mínimo de contribuição para 25 anos. Ao mesmo tempo, levantamento coordenado pelos professores Pablo Ortellado e Marcio Moretto (USP) e Esther Solano (Unifesp), mostrou que 74,8% dos manifestantes que foram à avenida Paulista chamados pelos movimentos pró-impeachment para apoiar o ato de combate à corrupção do dia 26 de março também se declarou contra essa reforma.

Matéria da Folha de S.Paulo, desta terça (9), estima uma média de liberação de emendas de quase R$ 6 milhões para cada deputado da base aliada.

Enquanto isso, o governo federal despeja milhões de reais em propaganda pró-reforma em veículos de comunicação e agências de publicidade, com especial atenção a rádios e TVs do Nordeste. São campanhas feitas não para informar sobre o tema, com todos os lados da questão, mas de convencer. A alta rejeição ao projeto preocupa os parlamentares da região, receosos de não serem reeleitos em 2018. Tanto que o governo espera que essas propagandas façam ”efeito” para que a proposta de emenda constitucional tenha chance de conquistar o mínimo dos 308 votos necessários.

O Poder Executivo – um dos lados interessados na questão, uma vez que a proposta partiu dele – gasta dinheiro público para convencer o país de que sua reforma é boa, enquanto os opositores à reforma não têm a mesma facilidade para divulgar os argumentos contrários.

O Tribunal Regional Federal da 4a Região já havia mantido uma suspensão de campanha publicitária pró-reforma do governo federal que havia sido decidida pela primeira instância. Contudo, a presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, suspendeu essa decisão em abril, afirmando que isso tira a possibilidade do governo de divulgar a motivação da proposta. E que se houver conteúdo inverídico em uma peça publicitária, que a restrição seja pontual.

Mas a discussão não é apenas o conteúdo da campanha, mas a campanha em si. Isso significa que a própria Justiça – ao endossar uma ação de propaganda política que é claramente de convencimento e não de informação – está desequilibrando esse debate e restringindo a força do contraditório.

Em outras palavras, o brasileiro comum (aquele que terá que contribuir por 40 anos se quiser a aposentadoria integral; que deverá pagar o carnê por, no mínimo, 25 anos se quiser se aposentar; ou que, sendo muito pobre, terá que esperar mais três ou cinco anos para poder receber o benefício concedidos a idosos pobres) é quem está bancando, com seus impostos, a campanha para convencer a si mesmo de que a Reforma da Previdência é legal.

A população não quer a reforma não porque o governo não sabe se comunicar, mas porque, pelo contrário, deixou muito claro o que queria. E não mostrou esforços pela restruturação do país que também incluam sacrifícios por parte dos mais ricos, que não dependem do INSS ou de serviços públicos porque podem pagar pelo seu presente e seu futuro.

A sociedade mudou, a estrutura do mercado de trabalho mudou, a expectativa de vida mudou. Portanto, as regras que regem as relações trabalhistas e a Previdência Social podem e devem passar por discussões de tempos em tempos. Contudo, a discussão não pode ser conduzida de forma autoritária ou em um curto espaço de tempo como quer o governo e parte da elite econômica. Pois essas medidas não devem servir para salvar o caixa público, o pescoço de um governo e o rendimento das classes mais abastadas, mas a fim de readequar o país diante das transformações sem tungar ainda mais o andar de baixo.

O Congresso Nacional e o Palácio do Planalto deveriam ter a decência de discutir a Reforma da Previdência em 2018. Qual seria o comportamento dos nobres parlamentares com relação a essa matéria sabendo que seriam avaliados, pouco tempo depois, pelo seu eleitorado nas urnas?

Liberação de emendas para demandas locais e peças bonitas de propaganda despejadas sobre seus eleitores seriam o suficiente para garantir seu voto?

Um parlamentar pode ser muitas coisas. Mas burro não é uma delas.

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